A psicopatia é um transtorno de personalidade amplamente discutido na mídia, na cultura pop e, cada vez mais, em estudos científicos. No entanto, embora retratada frequentemente como sinônimo de violência e maldade, a psicopatia é um fenômeno muito mais complexo, com raízes na biologia, no ambiente e no comportamento social.
Neste artigo, baseado na entrevista com a Dra. Bruna Valério — neurocientista e pesquisadora da UFRJ — exploraremos o que é a psicopatia baseada em evidências, suas bases neurológicas, suas diferenças em relação ao transtorno de personalidade antissocial, e os muitos desafios do diagnóstico e tratamento.
O que é psicopatia?
O termo “psicopatia” deriva do grego e em sua origem significava “doença da mente”. Ao longo do tempo, seu uso foi refinado. Hoje, refere-se a um conjunto de traços de personalidade que incluem:
- Falta de empatia e remorso
- Comportamento manipulador e egocêntrico
- Baixa tolerância à frustração
- Impulsividade e busca por sensações fortes
- Frieza emocional e charme superficial
Psicopatia x Transtorno de Personalidade Antissocial
Embora sejam frequentemente confundidos, a psicopatia e o transtorno de personalidade antissocial (TPA) não são a mesma coisa. O DSM-5 reconhece oficialmente o TPA, mas não a psicopatia como um diagnóstico clínico. No entanto, o psicopata pode ser enquadrado no TPA — embora nem todo antissocial seja psicopata.
A principal diferença está no escopo: o TPA avalia mais os comportamentos antissociais visíveis, enquanto a psicopatia inclui aspectos interpessoais e emocionais, como falta de empatia, remorso e apego emocional.
Como se diagnostica a psicopatia?
O principal instrumento usado é o Psychopathy Checklist-Revised (PCL-R), desenvolvido por Robert Hare.(inclusive temos esse teste aqui no site para você descobrir se é psicopata 😤🔪) Essa escala contém 20 itens, cada um pode dar uma pontuação de 0 a 2. Uma pontuação final acima de 30 (em 40) sugere traços significativos de psicopatia.
O PCL-R é especialmente usado no contexto forense para avaliar risco de reincidência criminal, mas também pode ser aplicado clinicamente.
Neurociência da psicopatia
Estudos com neuroimagem revelam que o cérebro de pessoas com traços psicopáticos apresenta alterações significativas em regiões como:
- Amígdala: relacionada à resposta emocional e ao medo. Muitas vezes, mostra-se hipoativa em psicopatas.
- Córtex pré-frontal ventromedial: envolvido no controle de impulsos, planejamento e julgamento moral. Danos ou mau funcionamento nessa área reduzem a capacidade de antecipar as consequências emocionais dos atos.
- Ínsula e córtex cingulado anterior: áreas relacionadas à empatia e dor social — com baixa ativação quando o psicopata observa o sofrimento alheio.
Essas alterações explicam, em parte, por que o psicopata reconhece que algo é errado, mas não sente que é errado.
A empatia no psicopata
Um dos aspectos mais debatidos é a ausência ou distorção da empatia. Psicopatas não ativam, de maneira natural, áreas cerebrais associadas à empatia quando observam sofrimento. No entanto, alguns podem ativar essas regiões voluntariamente, o que indica uma empatia mais “cognitiva” do que “afetiva”.
Psicopatia e violência: todo psicopata é perigoso?
Não. Nem todo psicopata é um criminoso violento. Alguns traços psicopáticos — como frieza, ausência de culpa e habilidades manipulativas — podem, inclusive, favorecer carreiras em ambientes competitivos, como grandes empresas, política e setores militares.
Contudo, a combinação de impulsividade, ausência de empatia e tendência ao risco pode sim favorecer comportamentos agressivos, especialmente quando há fatores ambientais (como abuso na infância) e predisposição genética.
O papel do ambiente e da genética
A psicopatia não é exclusivamente genética, nem puramente social. Estudos mostram que há uma interação entre genes (como o da enzima MAOA) e o ambiente (especialmente traumas infantis). Pessoas com certas variantes genéticas e histórico de abuso têm maior risco de desenvolver comportamentos antissociais e violentos.
Psicopatas podem ser tratados?
O tratamento da psicopatia é um dos maiores desafios da psiquiatria e psicologia. Como é um transtorno de personalidade, não há “cura”, mas intervenções podem reduzir comportamentos de risco.
Alguns caminhos possíveis:
- Psicoterapia (com abordagem estruturada e consistente)
- Terapias de regulação emocional
- Uso de antidepressivos ISRS (para modular impulsividade e agressividade)
- Estimulação transcraniana, ainda em fase experimental, para modular o córtex pré-frontal
No entanto, muitos psicopatas manipulam terapeutas ou abandonam o tratamento, o que dificulta os avanços.
Psicopatia na sociedade: o perigo silencioso
Psicopatas funcionais — aqueles que não cometem crimes evidentes — podem estar presentes em cargos de liderança, ambientes corporativos ou familiares. São pessoas que usam charme, mentira e manipulação para alcançar seus objetivos, sem se preocupar com as consequências alheias.
A sociedade precisa estar atenta para identificar comportamentos tóxicos que causam sofrimento psicológico, mesmo quando não há violência física envolvida.
❓FAQs sobre Psicopatia
1. Todo psicopata é um criminoso?
Não. Muitos vivem entre nós sem cometer crimes, mas podem causar sofrimento emocional e manipular pessoas.
2. Psicopatia tem cura?
Não, mas é possível mitigar comportamentos de risco com acompanhamento terapêutico e, em alguns casos, medicamentoso.
3. Psicopatas nascem assim ou se tornam?
Os dois, é uma interação entre predisposição dos genes e fatores do ambiente, como traumas e negligência na infância.
4. Psicopatas têm sentimentos?
Podem ter, mas são emocionalmente superficiais. Falta-lhes empatia profunda e remorso real.
5. Como lidar com um psicopata?
Estabeleça limites claros, evite confrontos diretos e, se necessário, procure apoio psicológico ou jurídico.